terça-feira, 16 de agosto de 2022

CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

ORIGEM E EVOLUÇÃO DA TECNOLOGIA DE ALIMENTOS

O início da tecnologia de alimentos remonta à pré-história da humanidade. Com criatividade e talento, de forma empírica, ao longo de séculos as pessoas descobriram e aprimoraram meios para preparar e conservar alimentos, dando origem às bases de várias técnicas de processamento utilizadas na sociedade contemporânea. Com os avanços da ciência dos alimentos estas técnicas foram incorporando princípios científicos à experiência, formando assim as bases da tecnologia de alimentos atualmente empregada na fabricação de ingredientes e produtos alimentícios, bem como embalagens para acondicionamento de alimentos e bebidas processados.

Para uma melhor visualização da evolução da tecnologia de alimentos é apresentada uma linha do tempo que revela fatos que evidenciam o surgimento de diversas técnicas e seu aperfeiçoamento. Inicialmente, essa linha do tempo destaca as tecnologias de conservação dos alimentos, desde a antiguidade e épocas mais recentes até a atualidade, que se constituíram nas bases para a garantia do abastecimento e segurança dos alimentos das civilizações modernas.

É importante ressaltar que a relação de fatos tem apenas caráter ilustrativo, sem o objetivo de formar um histórico da tecnologia de alimentos que é um assunto bem mais complexo.

Princípios básicos das tecnologias de conservação de alimentos

Basicamente, as tecnologias de conservação agem para contenção ou eliminação de  microrganismos deterioradores dos alimentos. Os microrganismos presentes nos alimentos pertencem aos grupos das bactérias, fungos, protozoários e vírus, provenientes de várias fontes de contaminação, entre as quais o solo, água, plantas, equipamentos e utensílios, trato intestinal, manipuladores, ar e pó.

Os alimentos possuem um número muito grande de componentes, sendo que água, proteínas, gorduras ou lipídeos e carboidratos estão presentes em maior quantidade. Outros componentes presentes em menor quantidade são minerais, vitaminas e ácidos nucléicos.

Assim como o ser humano e outros animais conseguem digerir e aproveitar boa parte dos componentes presentes nos alimentos, os microrganismos também conseguem fazê-lo. Por isso, se os microrganismos tiverem contato com o alimento e as condições forem favoráveis, eles vão promover uma espécie de digestão (deterioração) deste alimento e torna-lo inadequado para o consumo.

Para que o alimento possa ser conservado por mais tempo, é necessário destruir total ou parcialmente os microrganismos capazes de crescer no alimento, modificar ou eliminar uma ou mais das condições favoráveis ao desenvolvimento dos microrganismos e ou adicionar aos alimentos substâncias que impeçam sua multiplicação.

Ação das tecnologias de conservação de alimentos sobre os microrganismos

Adição de açúcar: funciona de forma análoga ao sal, na medida em que aumenta a pressão osmótica e diminui a atividade de água, criando um ambiente desfavorável para multiplicação das bactérias e de parte dos fungos. Exemplos de produtos são doces, geleias, frutas cristalizadas etc.

Alta pressão:  os alimentos são submetidos a pressões elevadas que inativam as células dos microrganismos, com ou sem aplicação de calor.

Aquecimento ôhmico e por rádio frequência: a aplicação de micro-ondas ou rádio frequência  gera calor por meio da energia dielétrica resultante da fricção das moléculas de água, sendo assim utilizados para conservação dos alimentos.

Cocção: preparo de alimentos utilizando temperaturas muito altas, como fervura, fritura e assamento.

Concentração: usa o calor para remover parte da água (30 – 60%) dos alimentos, como no caso da produção de sucos concentrados, molhos de tomate, leite condensado, doces etc.

Congelamento: nesse método são utilizadas temperaturas mais baixas do que na refrigeração (usualmente, -10 à -40ºC), que baixam a atividade de água e destroem parte da população microbiana do alimento devido principalmente à formação de cristais de gelo no interior de suas células.

Cura: método de conservação que consiste na adição de sal de cura aos alimentos. Esse método também confere ao produto determinadas características sensoriais, como a cor vermelha ou rosada. Usualmente, o sal de cura contém 99,5% de cloreto de sódio (sal) e 0,5% de nitrito sódio ou potássio. Exemplos: bacon e carnes.

Defumação: método de conservação no qual o alimento é exposto à fumaça produzida pela combustão incompleta da madeira, fazendo com que ele perca água e receba compostos com função antisséptica e aromatizante. Além do sabor o alimento ganha coloração característica dos alimentos defumados. São exemplos as carnes e alguns derivados, bacon e certos tipos de queijo.

Esterilização: tratamento térmico mais intenso que leva à destruição total dos microrganismos presentes, incluindo os esporos bacterianos, células mais resistentes. São normalmente realizados em equipamentos chamados autoclaves.  Exemplos são os alimentos enlatados.

Fermentação: crescimento de bactérias que promovem o desenvolvimento de acidez, que inibe o crescimento da maioria dos microrganismos. É o caso de iogurtes, picles, salames etc.

Irradiação com luz ultravioleta: são empregadas para inativar microrganismos presentes na superfície dos alimentos e embalagens, bem como para a desinfecção de superfícies que entram em contato com os alimentos.

Irradiação com raios gama: consiste na aplicação de doses baixas de radiação gama, sendo usado basicamente para reduzir a carga microbiológica das especiarias moída, evitar o brotamento de batatas e cebolas, controlar a infestação de insetos na farinha de trigo integral e para desinfecção de frutas.

Pasteurização: tratamento térmico que elimina todos os patógenos e parte dos microrganismos presentes no alimento. Como a eliminação é parcial, o prazo de validade do produto é menor, além de ser necessário mantê-lo refrigerado. É o caso do leite pasteurizado.

Pulso Elétrico (PFE):  o alimento é submetido a campos elétricos de pulsos de curta duração e alta intensidade , os quais inativam ou destroem os microrganismos indesejáveis.

Refrigeração: esse método reduz a multiplicação dos microrganismos presentes nos alimentos, sendo utilizado como meio de armazenamento e conservação básica, inclusive em nossos lares. As temperaturas aqui utilizadas são superiores a 0°C.

Salga:o princípio desse método baseia-se na retirada da água dos alimentos utilizando-se o sal, diminuindo a atividade de água e aumentando assim sua conservação. São exemplos as carnes salgadas, bacalhau etc.

Secagem: usa o calor para remover a água dos alimentos, produzindo alimentos como vegetais e carnes desidratadas, massas alimentícias, leite em pó, café em pó etc.

Secagem supercrítica: usa o calor para remover a água dos alimentos, mas com temperaturas mais baixas que a secagem convencional, gerando produtos de melhor qualidade.

Tratamento térmico: no tratamento térmico são aplicadas temperaturas que destroem totalmente os patógenos e que destroem parcialmente (pasteurização) ou totalmente (esterilização – enlatamento) os microrganismos deterioradores.

Ultrassom:  Redução de microrganismos patogênicos em temperaturas mais baixas.Inativação enzimática; Inativação microbiana (preservação).

Uso de aditivos: esse método consiste na adição de substâncias químicas devidamente aprovadas pelas autoridades competentes (aditivos) ao alimento com o propósito de melhorar sua coloração, textura, aroma, consistência, sabor e também de conservá-los por mais tempo. Alguns exemplos desse último grupo de aditivos são: benzoatos, sorbatos, bissulfito, nitrito e peptídeos antimicrobianos como a nisina.

Outros fatores responsáveis pela deterioração dos alimentos

Parte considerável dos efeitos da degradação causada por microrganismos se deve à ação de enzimas que eles produzem e liberam no alimento. As enzimas são moléculas catalisadoras, ou seja, têm a propriedade de acelerar as reações químicas. As proteases são enzimas que degradam proteínas, produzindo peptídeos e aminoácidos, que podem causar várias alterações indesejáveis no alimento como sabor amargo. As lipases são enzimas que degradam as gorduras, que também podem levar a alterações indesejáveis como a rancidez. No entanto, os alimentos podem conter suas próprias enzimas, que também contribuem para a sua deterioração.

A deterioração do alimento pode ainda se dar por reações químicas espontâneas, ou seja, não catalisada por enzimas. Um exemplo é a reação do ranço oxidativo, relacionado à degradação de gorduras saturadas. A oxidação é uma das mais importantes causas da deterioração de alimentos, podendo conduzir à perda de sabor e cor, à modificação da textura e à formação de compostos tóxicos. É por isso que aos alimentos passíveis de sofrerem oxidação são adicionados aditivos com propriedades antioxidantes como ácido ascórbico, tocoferol e vários outros.

Fatores físicos como luz e temperatura também podem causar alterações no alimento. Um exemplo é o processo oxidativo acelerado pela luz, ou fotooxidação.

ATIVIDADE DE ÁGUA DO ALIMENTO

os microrganismos necessitam de água numa forma disponível para crescer. O valor absoluto de atividade de água fornece uma indicação segura do teor de água livre do alimento, sendo esta a forma ideal de água usada pelos microrganismos. As bactérias são usualmente mais exigentes quanto à disponibilidade de água livre, seguida dos fungos (bolores e leveduras). Alguns fungos são especialmente tolerantes à baixa atividade de água. Exemplos de alimentos com alta atividade de água: carne, leite e outras bebidas, vegetais enlatados em salmoura, frutas enlatadas em calda, etc. Exemplos de alimentos com baixa atividade de água: geleias, farinhas, chocolates, mel, macarrão, ovos, leite em pó, etc.

PH DO ALIMENTO

é um dos principais fatores intrínsecos capazes de determinar o crescimento, sobrevivência ou destruição dos microrganismos presentes no alimento. De modo geral, o pH ótimo para o desenvolvimento dos microrganismos é próximo do neutro (6,5 – 7,5). Quanto mais baixo o pH, ou seja, quanto mais ácido, mais difícil se torna para os microrganismos crescerem. Os alimentos pouco ácidos (pH maior que 4,5) permitem o crescimento da maioria das bactérias, bolores e leveduras, enquanto que os ácidos ou muito ácidos (pH menor que 4,5) restringem o crescimento de boa parte dos microrganismos.

POTENCIAL DE OXI-REDUÇÃO DO ALIMENTO (REDOX EH)

a presença do oxigênio é o fator que mais contribui para o aumento do potencial redox de um alimento, medido em milivolts (mv). Microrganismos que usam oxigênio (aeróbicos) como fungos, bactérias e leveduras oxidativas, requerem Eh positivo (acima de + 350 mv). Já os microrganismos que não usam oxigênio (anaeróbicos) requerem Eh negativo (abaixo de - 30 mv).

COMPOSIÇÃO DO ALIMENTO

os tipos de componentes presentes no alimento, bem como suas quantidades relativas determinam quais grupos de microrganismos têm mais chances de nele crescer.

TEMPERATURA AMBIENTE

é talvez o fator extrínseco mais determinante para o crescimento microbiano. Quanto mais longe da faixa ótima, menor é o crescimento do microrganismo. Porém, é importante ressaltar que os diferentes grupos de microrganismos têm diferentes faixas ótimas de crescimento. A maioria deles cresce melhor entre 20°C e 35°C, mas há aqueles que crescem bem em temperaturas altas (termófilos) e em temperaturas baixas (psicotróficos).

UMIDADE RELATIVA DO AR

influencia diretamente a atividade de água do alimento, de tal forma que se um alimento de baixa atividade de água for estocado em ambiente com alta umidade relativa, poderá ocorrer a deterioração.

COMPOSIÇÃO GASOSA DO AR

se o alimento for colocado em ambiente com menos oxigênio e mais CO2, ocorrerá o retardamento da deterioração do alimento. Esse sistema chama-se atmosfera modificada e é muito utilizado. Certos vegetais, principalmente frutas, são conservadas em atmosfera contendo ozônio, que não é recomendada para alimentos contendo muita gordura, pois acelera a rancificação.